Geração Z Desafia As Lideranças Despreparadas.
A pesquisa da ResumeBuilder.com, conduzida em janeiro deste ano nos EUA com 715 empregados, revelou que 30% dos gerentes evitam contratar membros da Geração Z, preferindo trabalhadores mais velhos. Paralelamente, 30% dos contratantes demitiram jovens da Geração Z logo no primeiro mês de trabalho. As razões incluem falta de engajamento, comunicação e postura inadequada. No Brasil, observa-se uma tendência similar emergindo entre os contratantes.
A Geração Z, nascida entre 1996 e 2010, traz ao mercado de trabalho valores e expectativas distintos das gerações anteriores, conforme destacado no relatório "Tendências de Gestão de Pessoas" do Ecossistema Great People & GPTW. Essa geração já é significativamente representativa no mercado, superando os Baby Boomers, segundo o IBGE, e compreendendo 23% da população brasileira. Nos EUA, constituem 24% da força de trabalho ativa de acordo com o Bureau of Labor Statistics.
Dependente digitalmente, a Geração Z faz da internet o seu mundo, deixando em segundo plano as relações interpessoais. Profissionalmente, busca ser desafiada constantemente sob pena de perder a motivação. Não cultiva vínculos nem fidelidade à empresa, estando disposta a sacrificar remuneração por bem-estar pessoal.
Profissionais mais velhos?
Para Danilca Galdini, diretora de insights da Cia de Talentos, que acompanha o mercado através de pesquisas como o Carreira dos Sonhos 2023, a preferência por profissionais mais maduros, conforme a pesquisa da ResumeBuilder.com reflete a valorização da experiência e da estabilidade em ambientes de trabalho cada vez mais complexos. “Mas é crucial reconhecer a importância da pluralidade de pensamento, que resulta da convivência multigeracional, para fomentar inovação e resiliência dentro das empresas”, pondera.
Ela recomenda a aproximação do público jovem sem pré-conceitos. E alerta as empresas a ouvirem o que estas pessoas têm para falar, entendendo suas expectativas e seus receios. Uma sugestão foi de promover a convivência entre diferentes gerações potencializando o que cada uma tem a agregar. “Também é necessário pensar em programas de desenvolvimento para fortalecer potencialidades e desenvolver gaps”, afirma a diretora.
Conflito de gerações?
Não. A resposta é de Rômulo Frota, sócio da Lux Cognitum, empresa especializada em desenvolvimento de pessoal, gestão e liderança. Para ele, a mudança de perfil de pessoal não é um fato novo. Sem generalizar, ele concorda com as características marcantes dos jovens tais como desapego e arrogância. O fato, entretanto, merece uma reflexão mais profunda, a começar pela criação sob o manto protetor dos pais.
Despreparo de lideranças
A boa notícia é que tem saída para esta realidade de analfabetos funcionais que tende a se consolidar, gerando alta rotatividade e vagas não preenchidas de trabalho. A solução passa, fundamentalmente, pelo desenvolvimento de lideranças capazes de se conectar com o novo universo. “Em sua maioria, as empresas não se preocupam em escolher e treinar verdadeiros líderes com formação para motivar e transformar”, afirma Rômulo.
“Será que as empresas podem se dar ao luxo de não contratarem os GenZ?”, questiona. Como Master em Programação Neurolinguística e especialista em Neurociências e Comportamento, Frota reafirma a necessidade de lideranças fortes treinadas em bases mais científicas, evitando o simples presenteísmo dos cursos prontos. “Não se pode mudar as características de toda uma geração, mas dá para habilitar as lideranças a oferecerem desafios permanentes e motivadores”, complementa.
Menor tolerância
A análise é compartilhada pelo estrategista e mentor de carreiras, Rogério Magalhães, da RMA Treinamento, que vai além. “O empresário brasileiro tende a assumir todos os papéis – empreendedor, gestor e líder – ainda contabilizando como custo o investimento em conhecimento e em desenvolvimento de habilidades”, sentencia. Outro olhar recai sobre o maior grau de tolerância que o empresário vem tendo com os contratados da Geração Z. “Quanto maior a tolerância, menor a performance do negócio”, lembra ele.
Líder é diferente de chefe
Especialista em Transformação de Negócios e fundador da FENP Digital, Esdânio Nilton Pereira analisa a questão sob o olhar de quem, de um lado, vivenciou a transição como gestor mais à moda antiga, e de outro, como mentor de líderes que sabe da necessidade de evoluir. “As empresas precisam adotar modelos mais flexíveis de trabalho e buscarem aproveitar muito mais a inteligência do que a carga horária”, recomenda.
Ele também engrossa o coro daqueles que apontam a inabilidade das lideranças como o maior desafio e assegura que 90% dos líderes ainda são chefes, hierárquicos na essência e que dão ordens, sem nenhum espírito colaborativo. “Até a Arábia Saudita discute a urgência de mudanças e a aceitação das diferenças”, conclui o autor do livro “A Arte do Crescimento da Empresa”.
Organizações do futuro
O consultor em Business Intelligence, gestão e processos André Boriz, CEO da Kami Tecnologia, diz que as características únicas da Geração Z exigem que as empresas repensem suas abordagens de recrutamento, gestão e cultura organizacional. “Adaptar-se a essas mudanças pode ser a chave para atrair e reter os melhores talentos e promover o florescimento das organizações no futuro”, afirma. De acordo com um relatório da ManpowerGroup, 87% dos empregadores globais estão priorizando a contratação da Geração Z para rejuvenescimento e inovação nas equipes.
“O olhar inovador e dinâmico dos jovens é essencial para organizações que desejam permanecer competitivas”, diz ele, destacando a capacidade de realizar múltiplas tarefas, aumentando a produtividade. Mas alerta que a característica marcante do individualismo pode comprometer o trabalho colaborativo em equipe. A saída apontada por ele é que as empresas adaptem seus processos de seleção para destacar aspectos como propósito, impacto social e flexibilidade em um ambiente de trabalho flexível e adaptável, sempre exercitando uma comunicação mais horizontal.
De choque a encontro
A presidente do Instituto de Tecnologia e Liderança (Inteli), Maíra Habimorad, também vê a solução pela via da liderança. “A nova geração espera que o líder seja compreensivo, acolhedor, que ajude no seu desenvolvimento e que compreenda suas dificuldades. Então realmente é um choque de gerações que a gente trabalha para transformar em um encontro”, afirma.
Para ela, é preciso criar uma cultura corporativa que incentive o diálogo e que o líder consiga se colocar de uma maneira mais vulnerável e aberta a escutar. “Esse movimento prepara a juventude a compreender e receber feedbacks construtivos”, diz Maíra Habimorad.
A realidade na empresa
Aurélio Ames, gerente-geral da Unylaser, fabricante de peças e conjuntos metálicos para as áreas agrícola, rodoviário, florestal, e construção, sediada em Caxias de Sul (RS), percebe que, em geral, há uma menor ambição na Geração Z. “Eu tenho 38 anos e lembro que quando me formei eu queria ser trainee, ter carro e morar sozinho, o que não vejo hoje”.
Com 35% do quadro de pessoal da Unylaser formado pela Geração Z, Ames observa que, mesmo no caso de jovens mais talentosos, a pressa e a intolerância para crescerem profissionalmente estão bem presentes. Sem muito comprometimento, esse grupo não veste a camiseta como em gerações anteriores que, por exemplo, não toleravam atrasos na entrega de resultados.
Alta rotatividade
Pós-Graduada em Gestão de Pessoas, a psicóloga e consultora empresarial, Janay Caon Pieruccini, presencia os desafios enfrentados tanto para empregadores quanto para candidatos. Suas horas de coaching de equipes lhe permite listar as maiores dores de ambos os lados. Se para os empregadores, a adaptação à tecnologia encabeça a lista, para a Geração Z, este definitivamente não é um problema. “Integrada por nativos digitais, a Geração Z tem uma relação intrínseca com a tecnologia e espera que as empresas adotem soluções inovadoras em seus processos”, comenta.
A psicóloga acrescenta que por serem transparentes e objetivos, também valorizam o feedback constante e construtivo. Sem retorno regular, partem para novas oportunidades em empresas com propósitos claros e com impacto positivo na sociedade. Sustentabilidade e inclusão são bem presentes.
O fato é comprovado pelo relatório da Gallup que mostra que 21% dos trabalhadores da Geração Z mudaram de emprego no último ano, taxa significativamente mais alta em comparação com outras gerações. “Entre as principais razões para a alta rotatividade estão a busca por melhores salários (70%), falta de oportunidades de desenvolvimento (50%) e a procura por um melhor equilíbrio entre vida pessoal e profissional”, ilustra.
Saúde mental é prioridade
Doutora em Psicologia, a também psicóloga Darli Chanine Baião, docente da Universidade de Fortaleza (Unifor), vê que essa geração do pós-liberalismo tem demandas muito específicas. Sem a preocupação de construir carreira, a Geração Z impulsiona as organizações a repensarem seu funcionamento. Tanto quanto a horários, esses jovens têm dificuldades de lidar com a configuração dos processos de trabalho.
“Trata-se de uma geração também mais crítica não só com temas sociais”, vivencia ela, que atua na área de Gestão e Saúde do Trabalhador.
A preocupação alcança as questões de saúde, especialmente a saúde mental, fator que a leva a questionar até que ponto vale aguentar no trabalho. Na dúvida, sem vínculos, busca outra oportunidade.
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